domingo, 14 de outubro de 2012

Terceirização e variabilidade dos custos da mão-de-obra


Lauro Brito de Almeida, Dr. EAC|FEA|USP(1)
[Introdução] A aprovação em comissão especial do Projeto de Lei no. 4.330, de 2004, proposto pelo deputado Sandro Mabel [PR-GO] relativo à regulamentação da terceirização, trouxe novas cores ao debate entre os que se posicionam a favor e contra. Independente da fase em que se encontra o Projeto de Lei no trâmite burocrático, a discussão – em especial aquelas fundamentadas tecnicamente – são sempre bem vindas. Nesse sentido, o Sr. Paulo Schmidt, vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho [ANAMATRA],em artigo publicado no Valor [2012, p.E2, 25/01], “Terceirização, um alerta à presidente Dilma”, argumenta:
Algumas lógicas perversas estão na gênese da terceirização. E a principal é tornar o custo fixo dos empregados em custo variável representado pelos empregados da prestadora. Como não há milagre nisso, esse custo variável se traduz em redução dos salários dos terceirizados, pelo aumento da jornada, precarização das condições de trabalho e pela transferência de responsabilidade de uma empresa para outra.
A mão-de-obra como custo/despesa fixo quando própria é uma interpretação correta, considerando o marco legal e institucional que regulamenta as relações trabalhistas em nosso país. Em geral, a mão-de-obra, terceirizada ou não é entendida como um custo e/ou despesa variável, lamentavelmente, um grande equívoco, induzindo a análises distorcidas. A flexibilidade na gestão da mão-de-obra temporária é utilizada, incorretamente, por muitos como se variável fosse, ignorando outros pontos fundamentais necessários para defini-la como tal. Em muitos livros textos de contabilidade de custos e congêneres, a mão-de-obra – quer própria ou de terceiros - é ensinada como variável. O objetivo deste texto é discutir os aspectos técnicos da variabilidade do custo da mão-de-obra, seja ela terceirizada ou própria.
[Variabilidade da mão-de-obra] O entendimento da mão-de-obra como um custo/despesas variável merece algumas considerações. Definir mão-de-obra como direta, ou seja, aquela diretamente identificada com um objeto de custos, como custo fixo ou variável não pode ser feita antes de uma análise que contemple questões que não só as puramente técnicas.  Objeto de custos é tudo aquilo sobre o qual você quer saber quanto custa. Como exemplo de objeto de custo, a reforma de sua casa. A reforma de sua casa é um objeto de custo, porque interessa a você saber qual é o custo dessa empreitada. Da mesma forma as organizações querem saber o custo da produção de um bem ou serviço, da elaboração de um projeto, de um setor etc.
A troca de mão-de-obra própria por terceirizada, em princípio, não significa que uma organização está alterando a sua estrutura de custos fixos com mão-de-obra. Independente se a mão-de-obra será utilizada na atividade-fim ou atividade-meio, alguns requisitos tem que ser atendidos para sua classificação correta como fixa ou variável. Uma regra básica de análise da variabilidade dos elementos de custos, aplicável a mão de obra, é se o consumo de um determinado recurso varia [de acordo com um determinado padrão de consumo] proporcionalmente a quantidade produzida de um determinado bem e/ou serviço. Não importa se é o produto final, ou quaisquer outros produzidos internamente na empresa, quer para produção de produtos finais, serviços administrativos, se estão alocados na atividade-fim ou atividade-meio. 
Nas atividades que se apropriam dos avanços tecnológicos, pelas características das atividades desenvolvidas, porção significativa dos custos de mão-de-obra são indiretos [ou seja, aqueles que não podem ser facilmente identificados com os objetos de custos]. Não podemos esquecer que há outros tipos de atividades nas quais as características operacionais das atividades são intensivas de mão-de-obra. Ainda que, nas atividades empreendidas pela organização, quer na produção de um bem e/ou serviço final ou não, o consumo de mão-de-obra fosse proporcional ao volume de produção, há o aspecto legal da remuneração. Sendo a remuneração fixa, independente da quantidade produzida, a mão-de-obra é custo/despesa fixa. Por outro lado, se a remuneração da mão de obra é em função da quantidade produzida [objeto de custo, neste caso, é um produto e/ou serviço x], é um custo/despesa variável. Há determinadas atividades nas quais a remuneração total do colaborador é composta de uma parte fixa e outra variável. Nestes casos, a parte fixa é determinada por lei, acompanhando o piso salarial da categoria, não permitindo ser remunerado por valor inferior.
[Considerações finais] Entender corretamente como o uso, consumo dos recursos estão vinculados aos seus objetos de custo, é fundamental para uma gestão adequada desses recursos, independente do tipo de organização, se com fins lucrativos ou não. Os livros textos de contabilidade de custos, muito dos quais simplesmente traduzidos, sem nenhuma preocupação com o ambiente legal e institucional que orienta, em especial, as relações entre capital e trabalho, contribuem para aumentar, ainda mais, a confusão reinante. A mão-de-obra, seja aquela a ser utilizada na produção do produto [bem ou serviço] final, ou na manutenção da estrutura da organização, por sua natureza, representa um potencial de serviço a ser utilizado. Sendo as atividades das organizações, em especial as com fins lucrativos, sujeitas a movimentos cíclicos, o potencial de serviços disponível de mão-de-obra [em geral expressos em horas homem], poderá, em determinadas circunstâncias ser subutilizado, utilizado na sua capacidade normal ou exceder. Pode haver, nessas circunstâncias ociosidade ou necessidade mais horas homem. Ocorrendo a necessidade de mais horas homem, há para os gestores duas alternativas: (i) contratação de novos colaboradores ou (ii) horas-extras. Mas, voltando à questão da terceirização da mão-de-obra, sendo ela regida por contratos de duração variada, com um mínimo estabelecido por lei, não a categoriza como um recurso variável. A terceirização possibilita gerir custos fixos, em princípio com custos menores, no curto prazo, de modo a ajustar a organização aos movimentos cíclicos da economia. Por fim, situações como essa são momentos adequados para, ao menos, discutir os paradigmas vigentes de interpretações que, usualmente, distorcem análises e induzem a decisões equivocadas.
(1)Lauro Brito de Almeida, Doutor em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP, Pós-Doutorando em Administração pelo PPAD PUC PR e Professor do PPG Mestrado em Contabilidade da UFPR. Interesses de pesquisas em Análise Gerencial de Custos, Economia de Empresas e Educação, Ensino e Pesquisa. Atuação e experiência profissional em Análise Gerencial de Custos, Orçamento Empresarial, Elaboração de Plano de Negócios para Pequenas e Médias Empresas, Analise Econômica e Financeira e Elaboração de Estudos e Pareceres. Contato: gbrito@uol.com.br

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