quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Impostos na nota fiscal: o copo esta meio cheio ou meio vazio?

Lauro Brito de Almeida, Dr. EAC|FEA|USP(1)

Nos meses de novembro e dezembro a mídia fartou-se em explorar o assunto "discriminação de impostos na nota fiscal". A Folha de São Paulo, apenas para citar um veículo, em sua edição de 11/12/2012, no Caderno Mercado informa que o " Projeto de Lei 12.741/2007 (que trata da discriminação dos impostos/tributos nas notas fiscais) foi sancionada  pela presidente Dilma com vetos."
O projeto, conforme o jornal, é de "iniciativa popular" com "apoio" da Associação Comercial de São Paulo e OAB.

O PL 12.741/2007, tem o propósito de fazer cumprir disposição da Constituição Federal de 1988, que dispõe sobre o detalhamento de impostos e tributos. As notas fiscais emitidas, grosso modo, terão que detalhar os valores aproximados dos seguintes impostos: ICMS, ISS, IPI, IOF, PIS, Cofins e Cide. Alguns dos impostos listados, exceto IOF, PIS, Cofins e Cide já são usualmente listados nas notas fiscais, quer para o consumidor final ou não.

Listar os impostos e tributos, está alinhado ao novo modismo "transparência" e os benefícios são duvidosos. No entanto, assim como na história do "copo meio cheio ou meio vazio", há informação incompleta e utopias. 

Uma das utopias é que os consumidores pressionarão mais o governo, quer pelo uso melhor dos recursos, quer pela redução da  carga tributária. Integrando o grupo de utópicos, dois economistas, em texto publicado no Caderno Mercado [Folha de São Paulo, 11/12/2012], com o título "Lei induzirá eleitor a exigir mais reciprocidade do estado", após discorrerem sobre o aumento do gasto público no período entre 1991 e 2011, do igual aumento da carga tributária, ao estilo Nostradamus, profetizam:
A Lei 12.741/12, que obriga os comerciantes a colocarem nas notas fiscais o valor de   sete tributos indiretos, põe dificuldade à estratégia de elevar a participação de tributos indiretos na receita tributária. Ela ajudará a diminuir a ilusão fiscal e aumentará a percepção sobre o real preço das atividades do governo, fazendo o eleitor exigir mais reciprocidade do governo.
Além dos erros conceituais cometidos pelos autores do texto, a opinião emitida ajuda a confundir ainda mais o leitor sobre como funciona a arrecadação de impostos em nosso país. 

O ICMS - Imposto sobre Circulação de Mercadorias, estadual é destacado nas notas fiscais, nas contas de Energia Elétrica, Telefonia, entre outras. Até o momento não tenho notícias que os contribuintes, de posse desses detalhes, pressionem os governos estaduais para melhor aplicação desses impostos e/ou redução [com a esperança utópica] no preço final dos bens e serviços.

Infelizmente o assunto vem sendo tratado com demasiada simplicidade, quero crer, inocência por parte de alguns [alguém já escreveu sobre os inocentes úteis], por parte de outros demagogia e oportunismo.

O consumidor precisa saber que não é o valor total dos impostos/tributos destacados na nota fiscal que será recolhido aos cofres dos erários municipais, estaduais e federal. Cada empresa, em função do seu tipo de negócio, da opção tributária repassa valores diferentes.

Convenientemente nesta discussão, foi esquecido que os impostos/tributos não são repassados integralmente tal como pagos pelos consumidores. Cabe, então, a pergunta: Porque nem todos os impostos/tributos, em geral, pagos pelo consumidores não são "in totum" repassados aos cofres do governo? 

Não há dificuldade em responder. É simples, pois, depende da opção da empresa por este ou aquele regime tributário. Por exemplo, caso opte pelo regime tributário chamado "lucro real", os impostos são compensados. Cabe lembrar, que na esfera estadual, há particularidades dependendo do estado da federação. 


Mas, vamos a um exemplo: Uma empresa atacadista compra determinada mercadoria para revender, Neste caso, em essência adquire dois ativos: (i) um, o equivalente monetário da  da mercadoria é contabilizada sem os impostos, para simplificar, somente o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) e (ii) o valor do ICMS devido sobre a mercadoria adquirida [no jargão dos contadores: crédito].

Quando a mercadoria é vendida, o valor do ICMS será calculado sobre o preço de venda [no jargão dos contadores: débito] - este sim, pago integralmente pelo consumidor final -  será compensado com o crédito [um ativo] adquirido por ocasião da compra. Ao cofre estadual será recolhido somente a diferença. Ilustrando numericamente, assumindo que as aquisições de mercadorias por uma empresa comercial, em um dado mês, gerem um ativo ICMS [crédito] de R$ 1.000 e as vendas um passivo ICMS [débito] de R$ 1.200, logo, será repassado ao erário estadual o valor de R$ 200. 

Há outros casos de compensação de impostos/tributos e todos os tipos de "estripulias" pelos fiscos estaduais, por exemplo, "Substituição Tributária" como estratégias para aumentar a arrecadação. E mais, notem que decorrente da política de desoneração dos custos sobre a folha de pagamento, há mais um encargo sobre o faturamento: contribuição patronal ao INSS.  O detalhamento dos impostos/tributos na nota fiscal, como não poderá deixar de ocorrer, resultará em custos adicionais para as empresas adequarem seus sistemas e práticas as novas regras. 

Meu receio é que o custo para obtenção da informação seja maior do que os benefícios gerados, quer para as empresas, quer para os consumidores. A conferir.


Por fim, além da complexidade do nosso sistema tributário, a falta de esclarecimentos corretos quanto ao funcionamento desse sistema aos consumidores - em especial as pessoas físicas - ao que parece, prevalece a disseminação e discussão do assunto é feita oportunisticamente em tom emocional, tal qual como foi na proposição da "ação popular". 

Então, senhoras e senhores: "O copo está meio cheio ou o copo está meio vazio"?

(1) Lauro Brito de Almeida, Doutor em Controladoria e Contabilidade pela FEA/USP, Pós-Doutorando em Administração pelo PPAD PUC PR e Professor do PPG Mestrado em Contabilidade da UFPR. Interesses de pesquisas em Análise Gerencial de Custos, Economia de Empresas e Educação, Ensino e Pesquisa. Experiência e atuação profissional em Análise Gerencial de Custos, Orçamento Empresarial, Elaboração de Plano de Negócios para Pequenas e Médias Empresas, Analise Econômica e Financeira e Elaboração de Estudos e Pareceres. Contato: gbrito@uol.com.br





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